“Foi uma tragédia, amigos, uma tragédia. Houve na cidade uma enchente de caixões. Pergunto: ‘Quem não morreu na espanhola?’”, escreveu Nelson Rodrigues, em 1961, recordando a pandemia que chegou ao Brasil em 1918 e foi particularmente cruel com o Rio de Janeiro.

“A impressão que me ficou daqueles dias foi a de que morreu todo mundo e de que não escapou nem rato. Ou por outra: só escapou o Fluminense. Enquanto a Morte, com M maiúsculo, fazia o seu Carnaval, o Fluminense teve forças para pôr no bolso mais um título”, acrescentou o cronista, respondendo à própria pergunta, em texto publicado no Jornal dos Sports.

O exagero sempre foi uma marca de Nelson, mas não há hipérbole na observação de que a gripe espanhola, como ficou conhecida a doença que desembarcou nos portos brasileiros em navios que partiram da Europa ao fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), foi devastadora.

Não há precisão estatística, porém os números mais conservadores apontam entre 20 milhões e 50 milhões de mortos no mundo. No Brasil, a variação nos registros vai de 20 mil a 35 mil mortos.

O país acordou do pesadelo com outra cara, transformação observada sobretudo no Rio, então sede do governo federal. Abatido pelo vírus, o presidente eleito, Rodrigues Alves, não pôde nem começar seu mandato. Só na capital, que tinha 1,1 milhão de habitantes, houve cerca de mil mortes por dia na quinzena mais aguda crise.

Existem semelhanças com a situação atual, a pandemia do novo coronavírus. Uma delas é que, embora o mundo fosse outro no que diz respeito à circulação de informações, o Brasil também não estava desavisado em 1918, com a gripe se espalhando de maneira destrutiva pela Europa e pela Ásia antes de aparecer na América do Sul. Como ocorre agora, o futebol teve que parar.

O Campeonato Paulista, por exemplo, ficou suspenso por mais de dois meses e só terminou em 1919. Jogos considerados descartáveis, que não influenciariam na luta pelo título, foram cancelados. E, ao fim de uma disputa por pontos corridos com algumas equipes tendo mais jogos do que outras, o Paulistano, do craque Friedenreich, levantou o troféu.

Durante a interrupção, o próprio Paulistano ofereceu espaço no clube, no Jardim América, para a montagem de um dos hospitais provisórios para o tratamento da doença, com 150 leitos. Outros 30 foram instalados na sede social do Palestra Itália, atual Palmeiras, que ficava na região central de São Paulo, na rua Libero Badaró.

Na pandemia de hoje, vários clubes pelo país também se mostraram solidários cedendo seus espaços. O estádio do Pacaembu, em São Paulo, passou por adaptação para servir como hospital de campanha.

Em 1918, já que o Recife era uma das cidades mais afetadas pela gripe, também foi suspenso o Campeonato Pernambucano. Após dois meses e meio de pausa na tabela, o América venceu duas das três partidas que lhe restavam e festejou, deixando para trás Santa Cruz,

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