Pepe era técnico do Al-Ahli, do Qatar, em 2003. Após uma partida, ele foi chamado para conversar com o presidente, dono do clube e futuro emir do paÃs, o xeque Ahmed bin Hamad Al Thani.
O chefe queria fazer uma pergunta para o treinador, mas o brasileiro não entendeu nada por não falar inglês. Pepe, então, chamou seu filho e auxiliar, Pepinho, para ajudá-lo. âPai, ele disse que pode contratar o Guardiola e quer saber se você aceitaâ, traduziu.
Dezessete anos depois, a história ainda diverte Pepe, 84. âComo eu não iria aceitar a contratação do Guardiola?â, ele questiona, para em seguida cair na gargalhada.
Por quase dois anos, o então veterano volante espanhol atuou no Qatar. O Al-Ahli foi seu penúltimo clube antes de começar a carreira de treinador e se tornar um dos mais badalados da história.
Guardiola foi a contratação do futebol do Qatar com a cabeça no passado. De um tempo em que xeques e bilionários donos de equipes estavam mais preocupados com o próximo resultado do que com o futuro do esporte do paÃs.
âHouve um jogo em que os xeques donos de dois clubes apostaram US$ 1 milhão em qual time venceria. O meu ganhou e eu fiz um golâ, disse o atacante Serginho, ex-Corinthians, à Folha em 2003. Ele atuava pelo Al Sadd, que disputou o último Mundial de Clubes no paÃs.
Foi naquele ano que Romário também assinou com o Al Sadd. Atuou apenas três vezes, não fez nenhum gol e voltou para o Brasil com US$ 1,5 milhão (R$ 6 milhões em valores atuais) do contrato.
Depois, outros atacantes badalados passaram por lá, mas já na curva descendente da carreira. O argentino Gabriel Batistuta confessou ter aceitado oferta do Al-Arabi, apesar das constantes dores no joelho, por causa dinheiro irrecusável.
âOs brasileiros no Qatar brincavam que eles [os dirigentes] plantavam uma roseira no quintal e saia petróleo”, relembra Pepe. Era competição entre eles, não apenas no futebol. Então, contratavam quem queriam. Ãs vezes consultavam o treinador, à s vezes não.”
A influência sul-americana na formação do gosto do qatari pelo futebol está nos técnicos da seleção do paÃs. Houve 37 até hoje, e 10 foram brasileiros.
âQuando eu cheguei ao Qatar pela primeira vez, em 2007, os jogadores tinham outros empregos, era um esporte semi profissional. Com o passar dos anos, eles foram investindo mais em formação e criando uma visão de longo prazoâ, diz Sebastião Lazaroni, técnico da seleção brasileira na Copa de 1990 e responsável pela equipe qatari de 2011 a 2012.
âEles sempre gostaram muito do nosso futebol e dos brasileiros. A famÃlia real do paÃs adora futebolâ, concorda Evaristo de Macedo, que dirigiu a seleção três vezes nos anos 1980